Entenda os casos relevantes para a economia que aguardam julgamento pelo STF em 2023

Entenda os casos relevantes para a economia que aguardam julgamento pelo STF em 2023

Ainda que a pauta de julgamentos do Supremo Tribunal Federal (STF) depois do recesso
em 2023 não esteja definida, uma parte dos processos que aguardam julgamento – e
estão em fase avançada, inclusive com votos proferidos – tem especial relevância pelo
potencial de impacto fiscal ou para diferentes setores econômicos.

Têm novas chances de serem julgados neste ano processos que aguardavam retornar
após pedido de vista — que é quando um ministro solicita mais tempo para analisar um
caso e paralisa a votação. Há um novo prazo, agora de 90 dias, para a devolução de vista.

Depois desse período, os processos voltarão a ser liberados automaticamente – até então
o prazo era de 30 dias, mas os ministros precisavam autorizar o retorno, o que nem
sempre acontecia no tempo previsto. Após a liberação, ainda podem haver novos pedidos
de vista ou de destaque, quando o julgamento transcorre no plenário virtual. Nesse último
caso, o julgamento reinicia e é levado ao plenário físico.

Entenda os processos de interesse econômico que podem estar próximos de serem
julgados.

Início da cobrança do Difal do ICMS
Em dezembro, a ministra Rosa Weber se comprometeu a levar o julgamento que discute o
início da cobrança do Difal do ICMS para o plenário físico logo após o fim do recesso, em
fevereiro de 2023. A discussão estava em ambiente virtual nas ADIs 7.066, 7.070 e 7.078,
mas a ministra pediu destaque dos casos.
Os processos discutem se a lei complementar para regulamentar o tributo, que recai em
compras destinadas a consumidor final de outro estado (como no caso do e-commerce),
precisa cumprir as anterioridades nonagesimal e anual antes do início da cobrança do
imposto. Esses princípios estabelecem prazos para adequação a novos tributos ou
aumentos de alíquotas.
Na prática, o Fisco pretendia recolher o imposto já em 2022, mas, como a lei foi publicada
em janeiro, os contribuintes defendem que a validade comece em 2023.
Em reunião com Weber, em dezembro, 15 governadores afirmaram que as perdas de
arrecadação para os estados são calculadas em R$ 11,9 bilhões caso prevaleça o
entendimento que o Difal do ICMS só pode ser cobrado em 2023. Os varejistas online são
os mais afetados pela decisão.
O julgamento será reiniciado. Antes, o placar estava em cinco votos para que ambas as
anterioridades fossem respeitadas; dois votos em favor do início da cobrança em 5 abril de
2022, completada apenas a noventena; e o entendimento isolado do relator, Alexandre de
Moraes, para quem o início deve se dar após 90 dias da criação de um site sobre o Difal,
conforme estabeleceu a lei.

Transferência de créditos do ICMS entre estados
O STF já afastou a incidência de ICMS sobre a transferência de mercadorias entre
estabelecimentos do mesmo dono localizados em estados distintos. Agora, precisará
definir quando a medida passa a valer, o que será julgado nos embargos de declaração da
ADC 49.
A principal questão é definir se os contribuintes, mesmo não pagando ICMS na
transferência de mercadorias, têm o direito a manter o crédito obtido ao comprar essas
mercadorias e também transferir esse crédito para as suas filiais em outros estados.
O relator, ministro Edson Fachin, votou para que os efeitos da decisão começassem neste
ano; no intervalo, os estados deveriam disciplinar a transferência de créditos de ICMS e, se
não o fizessem, os contribuintes teriam direito a transferir os montantes.
No placar atual, acompanham o relator a ministra Cármen Lúcia e o ministro Ricardo
Lewandowski
. Já Luís Roberto Barroso abriu divergência parcial, mantendo a modulação
de efeitos e a questão dos créditos endereçada por Fachin; Dias Toffoli estabeleceu prazo
de 18 meses após o julgamento para o início dos efeitos, acompanhado por Alexandre de
Moraes
e Luiz Fux.
O julgamento foi paralisado em maio passado, por pedido de vista de Nunes Marques. Ele
entregou o processo em dezembro e novo julgamento no plenário virtual é previsto para
ser reiniciado em 10 de fevereiro. Falta também o voto do ministro Gilmar Mendes.
Setores empresariais alegam que podem perder bilhões por ano em créditos tributários, a
depender da definição – a situação afeta desde a indústria ao agronegócio e o varejo.
Um parecer anexado aos autos por um dos amici curie desse processo calcula que as dez
maiores empresas do varejo brasileiro (como Carrefour e Magazine Luiza) podem perder
R$ 5,6 bilhões de créditos tributários de ICMS por ano, já que cerca 40% do comércio
brasileiro ultrapassa as divisas estaduais em operações dentro da própria empresa.

Dispensa sem justa causa
Esse caso se arrasta há 25 anos e é capaz de impactar a demissão sem justa causa – ao
demitir, o empregador poderá ter de justificar a medida (por razões financeiras ou baixo
desempenho, por exemplo).
A Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 1.625 está parada no gabinete do ministro
Gilmar Mendes desde outubro do ano passado, quando ele pediu vista. O STF julgará a
validade de um decreto assinado pelo presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) que
cancelou a adesão do Brasil à Convenção 158 da Organização Internacional do Trabalho
(OIT), em 1996.

Na época, o então presidente retirou o país do acordo pois um dos dispositivos do tratado
estava sendo interpretado de forma ambígua: se entendia que a demissão sem justa não
seria admissível, o que causava insegurança jurídica. O tratado falava que as demissões
não poderiam ser “arbitrárias”.
A Constituição estabelece que cabe ao Congresso definir a adesão a tratados, acordos ou
atos internacionais. Por isso, a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura
(Contag) questiona a constitucionalidade do decreto.
Após uma série de paralisações, atualmente o julgamento tem três correntes de
entendimento: três votos em favor da validade, três contrários e dois para que o decreto
seja analisado pelo Congresso. Faltam os votos de Gilmar Mendes, Nunes Marques e
André Mendonça.

A questão também é tratada na ADC 39, de 2015. Até agora, já votaram quatro ministros:
Dias Toffoli votou pela constitucionalidade do decreto; Edson Fachin pela
inconstitucionalidade, acompanhado por Ricardo Lewandowski e Rosa Weber. O
andamento também foi paralisado por um pedido de vista de Gilmar Mendes.

Cobrança de PIS e Cofins sobre receitas de bancos
O STF definirá se as instituições financeiras devem contribuir com o PIS e a Cofins sobre
suas receitas financeiras. Para tanto, os ministros precisam interpretar se esses recursos
são faturamento e, portanto, devem compor a base de cálculo dos tributos. Atualmente,
isso não acontece.
Esse julgamento começou em dezembro do ano passado no plenário virtual, com voto do
relator, ministro Ricardo Lewandowski. Ele concluiu que apenas as receitas brutas
decorrentes da venda de produtos e prestação de serviços pelos bancos devem ser
incluídas na base de cálculo dos tributos até 1998, quando a Emenda Constitucional 20
incluiu a incidência sobre a receita, sem qualquer discriminação.
Porém, o próprio ministro reconhece que há oscilações do STF sobre o conceito de
faturamento e que há correntes divergentes em relação ao assunto. O julgamento foi
paralisado por pedido de vista de Dias Toffoli.
A questão é tratada nos recursos extraordinários (RE) 609.096, 880.143 e 1.250.200. Eles
fazem parte do Tema 372 de repercussão geral desde 2011.

Redução da restituição de impostos a exportadores
O STF discute se o Poder Executivo pode alterar os percentuais de restituição tributária no
Reintegra, programa do governo federal criado em 2014 para promover a exportação de
produtos industrializados.

No ano seguinte, decreto reduziu o percentual de créditos que os exportadores teriam
direito – dentro dos limites estabelecidos previamente pela legislação, que previam a
reintegração entre 0,1% e 3% sobre a receita da exportação.
A Confederação Nacional das Indústrias (CNI) e o Instituto Aço Brasil moveram as ADIs
6.040 e 6.055 contra a capacidade de o Executivo reduzir percentuais sem motivação. As
entidades argumentam que não poderia haver modificações desse tipo pois o Reintegra
não é um benefício fiscal, e sim uma política para diminuir resíduos tributários e tornar os
produtos nacionais mais competitivos.
O relator, ministro Gilmar Mendes, entendeu que não há inconstitucionalidade na alteração,
já que o objetivo da política seria reintegrar integral ou parcialmente o resíduo tributário.
Dias Toffoli e Alexandre de Moraes haviam acompanhado o relator. Enquanto Edson
Fachin interpretou que não poderia haver mudanças pelo Executivo nem patamar máximo
para reintegração de impostos, mas percentual que assegurasse a devolução integral de
resíduos tributários conforme cada cadeia produtiva.
O ministro Luiz Fux pediu destaque em abril de 2022, então o julgamento precisará
recomeçar no plenário físico, ainda sem data.
De acordo com a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), caso a União perca,
pode haver impacto financeiro de R$ 7,3 bilhões anuais aos cofres públicos e devolução de
R$ 42,56 bilhões às empresas exportadoras.

Teto de indenização em ações trabalhistas
As ações que questionam o teto estabelecido pela reforma trabalhista de 2017 para o valor
das indenizações por danos morais (50 vezes o último salário contratual do trabalhador)
começaram a ser julgadas em 2021.
O ministro Nunes Marques pediu vista e ainda não devolveu o processo, o que agora
deverá atender ao prazo de 90 dias.
Até então, apenas o relator, Gilmar Mendes, havia votado, com o entendimento de que os
critérios para estipular o montante das indenizações são para orientação, então seria
possível estabelecer valores que ultrapassam os limites máximos previstos de acordo com
casos concretos.
O julgamento ocorre nas ADIs 6.050, 6.069 e 6.082.

Contrato de trabalho intermitente
Também presente na reforma trabalhista, o contrato de trabalho intermitente prevê que o
trabalhador somente atende o empregador quando acionado e se estiver disponível, sem cumprir jornada fixa. Assim, ele pode ser vinculado a diferentes empregadores, mas, caso
tenha pouca demanda, pode receber menos de um salário mínimo mensal, já que recebe
por hora.

O julgamento será reiniciado após pedido de destaque do ministro André Mendonça, em
novembro passado
. Até então, o relator, ministro Fachin, votara pela inconstitucionalidade
do contrato de trabalho intermitente, acompanhado por Rosa Weber. Já os ministros
Nunes Marques e Alexandre de Moraes entenderam pela constitucionalidade do modelo.
O julgamento se dá na ADI 5.826.

Multas tributárias punitivas
Tramitam no STF diferentes ações questionando penalidades aplicadas pelo fisco e a
validade de elas ultrapassarem o imposto devido.
O RE 796.939 e a ADI 4.905 (tema 736 da repercussão geral) seriam julgados em junho do
ano passado, mas foram retirados da pauta. Os ministros debaterão a regularidade da
multa quando pedidos de ressarcimento ou de compensação não são homologados pela
Receita Federal – a penalidade é de 50% sobre o valor alvo do pedido.
O ministro Edson Fachin votou pela inconstitucionalidade da punição nesses casos,
acolhendo o argumento dos contribuintes de que a multa incide apenas pela recusa do
fisco, sem que se constate ter havido má-fé no pedido.
Com julgamento ainda não iniciado, há ainda RE 736.090 (tema 863), que questiona se é
aceitável a aplicação da multa fiscal qualificada em razão de sonegação, fraude ou conluio,
fixada em 150% sobre o imposto não pago ou não declarado devidamente. Contribuintes
alegam que o alto montante teria efeito confiscatório, o que é vedado pela Constituição. O
relator é o ministro Dias Toffoli.
Na mesma linha, o RE 1.335.293 (tema 1.195) discute a possibilidade de fixação de multa
tributária punitiva, mas não qualificada, em montante superior a 100% do tributo devido. O
caso teve repercussão geral reconhecida no ano passado, e o relator é o ministro Nunes
Marques.
Tributação sobre remessas ao exterior
O julgamento sobre a constitucionalidade da incidência da Contribuição de Intervenção no
Domínio Econômico (Cide) sobre remessas ao exterior foi retirado de pauta no ano
passado. A pauta é particularmente relevante para os setores de tecnologia e
telecomunicações.
Os ministros discutirão se é constitucional que o tributo incida sobre todos os valores
pagos, creditados, entregues, empregados ou remetidos ao exterior como remuneração por licenças de uso e transferência de tecnologia, serviços técnicos e de assistência
administrativa, além de royalties.
A interpretação pela invalidação é que o tributo, criado em 2000, deveria incidir apenas
sobre remessas ao exterior para o pagamento por transferência de tecnologia, com o
objetivo de estimular a inovação e o desenvolvimento no mercado nacional. Porém, a
contribuição teria passado a incidir sobre quase todos os pagamentos remetidos ao
exterior.
A depender do desfecho, o RE 928.943 (tema 914) pode representar impacto de R$
17,9 bilhões aos cofres públicos, segundo cálculos da Fazenda.

Fonte: JOTA

LETÍCIA PAIVA – Repórter em São Paulo, cobre Justiça e política. Formada em Jornalismo pela Universidade de
São Paulo. Antes do JOTA, era editora assistente na revista Claudia, escrevendo sobre direitos humanos e gênero.
Email: leticia.paiva@jota.info


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